sábado, 7 de dezembro de 2013

A GRANDE BELEZA

NÓS ASSISTIMOS, A GRANDE BELEZA
Resenha de Filme: A Grande Beleza
Raimundo Neto | 8 de outubro de 2013 



Onde está a verdadeira beleza? Na festa hedonista e catártica, nos levando as sensações mais primárias? No romance mais tenro e verdadeiro, provocador de saudades? E nas palavras conjuradas pelo talento de intelectuais e estudiosos, reside a autêntica beleza? Ou seria na religião e seu dogmas edificantes o seguro caminho para a graça? Na melancolia da morte também encontramos encantos à serem admirados? Muitas perguntas e poucas respostas assertivas encontramos em A Grande Beleza, de Paolo Sorrentino. Ora tripudiando da certeza de outros, o filme tem apreço pelo humor ácido, ora aprovando a singeleza de situações menores, quando flerta com discussões intimas e existenciais, o importante é o caminho a ser seguido, nunca se atendo ao simplismo de constatações institucionalizadas.


No primeiro momento de A Grande Beleza nos deparamos com o escritor sexagenário Jep Gambardella (Toni Servillo) em uma festa monumental para celebrar seu aniversário. Não seria nenhum exagero afirmar que tal sequência que dura cerca de vinte minutos é uma das mais notáveis cenas do cinema em 2013. Abalizado por travellings voadores e enquadramentos inusitados, a intenção maior de Sorrentino é mostrar o quanto uma festividade, apesar dos comuns abusos de álcool e drogas, pode ser libertadora. Em seguida, após o sexo furtivo com uma desconhecida, ouvimos as primeiras considerações de Jep. De olhar sarcástico, o escritor parece não levar nada muito à sério, onde tudo pode e deve ser desmitificado. A posterior entrevista de Jep com um performática espiritualista externa com eficiência esse seu ceticismo.


Jep é um intelectual, notório por ter escrito um livro de sucesso ainda na sua juventude. Vive rodeado por amigos semelhantes. E entre festas efusivas, como a que abre o filme, e discussões sobre política e pensadores que normalmente não levam à nada, Jep e sua turma são liberais que nunca saem do lugar comum, adoram a zona de conforto que transitam. É quando A Grande Beleza trata de tirar sarro desses que tendem ao “intelectualismo”, com todos os “ismos” que merecem. Tal etapa do filme é marcada por Jep destruir uma colega ao argumentar sobre o que a levou ao sucesso: sua condição financeira e o apoio irrestrito de partidos políticos. Cabe aqui um posicionamento sobre o valor do que é visto e publicado. Sorrentino parece querer dizer que muitas vezes a “beleza” é ditada por algo ou alguém que entende pouco, ou nada, dela.

A controvérsia levantada sobre o valor do intelectual parece paradoxal. Afinal, não seria A Grande Beleza um filme para pensadores? A resposta pode até ser afirmativa, mas não repleta de certeza. O trabalho de Sorrentino é repleto de camadas para serem vistas de diversas perspectivas. Passando longe de ser modorrento, hermético na intenção de soar inteligente, a construção da narrativa é tão fluída quanto mordaz. O diretor demonstra pleno domínio do que quer mostrar e igual competência ao trazer para tal debate pessoas comuns, gente como a gente. Então, não demora até encontrarmos um típico sujeito de classe média, viúvo da grande paixão de Jep no passado, onde surgirão as divagações sobre o amor incondicional. Apesar de hoje ser um cínico, outrora Jep viveu um romance tórrido que parece ter lhe custado a sensibilidade.

Uma outra personagem importante para dialogar com a beleza mundana é a stripper quarentona, Ramona (Sabrina Ferilli), com qual o nosso protagonista se relaciona numa especie de busca interior por sentimentos esquecidos. Tanto com o viúvo quanto com a stripper residem ápices tocantes de rara sensibilidade. No terceiro ato de A Grande Beleza as colocações sobre morte e religião são disseminadas com intensidade. Imagens imponentes de esculturas sacras históricas indicam à admiração do homem pelos suas próprias construções. Criatura querendo brincar de criador? Sem nunca perder o humor, é também quando o filme mais se afirma como cinema italiano na sua essência. As memórias ganham forma, sonhos transitam com a realidade e a fantasia é uma constante. Por isso é de costume ler e ouvir comparações desse maravilhoso trabalho de Sorrentino com o de mestres da poesia visual como Federico Fellini.

Em A Grande Beleza, Paolo Sorrentino brinca com esterótipos enquanto passeia pelo que motiva e deslumbra o ser humano. O que é belo para uns, para outros, é monstruoso. E vice-versa. Afinal, a beleza não está nos olhos de quem vê?

Ficha Técnica:

Título Nacional: A Grande Beleza
Título Original: La Grande Belleza
Direção: Paolo Sorrentino
Roteiro: Paolo Sorrentino, Umberto Contarello
Duração: 142 min.
País: Itália, França
Ano: 2013
Elenco: Toni Servillo, Carlo Verdone, Sabrina Ferilli, Carlo Buccirosso, Serena Grandi.

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