sábado, 7 de dezembro de 2013

FRANCES HA

NÓS ASSISTIMOS - FRANCES HA

Crítica: 'Frances Ha' é filho bastardo e irresistível da nouvelle vague



É preciso estar de mal com a vida, ter o coração de pedra, ser ruim da cabeça ou doente do pé para resistir à cena de "Frances 
RICARDO CALIL
CRÍTICO DA FOLHA
Ha" em que a protagonista sai correndo e dançando pelas ruas de Nova York ao som de "Modern Love", de David Bowie.
Não deixa de ser um golpe baixo (garota encantadora e desengonçada + clássico absoluto de Bowie).

 Quando muita gente começa a louvar um filme sumariamente independente, daqueles que não prometem absolutamente nada e os envolvidos são quase desconhecidos, e colocá-los em listas de melhores do ano é porque ali consta uma obra que devemos, ao menos, prestar uma atenção a mais. É o caso desse filme de Noah Baumbach, um diretor que vem cada vez mais crescendo e se fazendo presente dentro desse cenário independente americano. E aqui, não cansa de fazer referências visuais e textuais a outros cineastas como Woody Allen, por exemplo. E nada me tira da cabeça que Frances é, na verdade, uma espécie de extensão de Poppy, personagem do filme de 2009 feito por Mike Nichols, Simplesmente Feliz. Com características próprias, a personagem principal - e que dá o título - de Frances Ha não demora a nos conquistar e contagiar a tela. A ela, sobra a principal característica que uma protagonista de um filme desses deve ter: carisma. E dessa forma, faz um verdadeiro espelho de certas características de nós mesmos. A personagem é tão fracassada, tão azarada, perdida, e por vezes, parece tão desagradável que não tem como não enxergar a si mesmo em algum momento do filme. E o maior acerto do filme é o tom propositalmente leve dado a todas as "desgraças" pelas quais Frances passa, atingindo seu ápice numa sequência divertidíssima em que a personagem, num ato de profunda imaturidade, resolve fazer uma viagem até Paris de última hora e perde absolutamente todos os compromissos possíveis que ela poderia desfrutar: ou por estar em Paris quando sua melhor amiga, em NY, a chama para uma festa de despedida; ou por já ter voltado para NY quando recebe um telefonema sobre um jantar com uma velha amiga em Paris; ou por dormir demais. O fato é que esse foco em "como será a vida após a faculdade" não é muito bem uma inovação no cinema hollywoodiano dos últimos anos, mas são raras as vezes que um realizador acerta ao olhar para uma história extremamente pessimista com otimismo. E o legal aqui é justamente a forma com que Frances encara cada momento de sua vida (representado muito bem, como em capítulos de um livro, pelo endereço de cada casa que a garota morou nesse período de tempo) com um olhar do tipo "eu poderia estar pior". E por mais que se sinta derrotada em relação a todos os que ascendem ao seu redor, ela continua com a esperança de que aquilo pode (e vai) melhorar. Em meio a cenas emocionantes e vergonha-alheia na mesma medida, no fim, não deixa de ser uma questão de auto-estima.

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Mas é um golpe baixo ansiosamente aguardado: aquele que vai libertar o cinema independente americano de anos de pretensão e cinismo para oferecer um momento de prazer fugaz, frugal.
 

Cena do filme 'Frances Ha', produzido pelo brasileiro Rodrigo Teixeira
Cena do filme 'Frances Ha', produzido pelo brasileiro Rodrigo Teixeira
"Frances Ha" é filho bastardo da primeira nouvelle vague (do Godard que disse que tudo de que se precisa para fazer um filme é uma arma e uma garota) com o mumblecore (o subgênero de baixo custo, diálogos naturalistas e personagens balbuciantes).
Não por acaso, "Frances Ha" tem na trilha músicas de Georges Delerue (o compositor "oficial" da nouvelle vague) e é escrito e protagonizado por Greta Gerwig, musa do mumblecore. Frances, sua personagem, se aproxima dos 30 anos assolada pela falta de perspectivas.
Ela é assistente em uma companhia de dança, mas não é boa o suficiente para virar bailarina.
Como uma moderna Cabíria (a esperançosa personagem de Giulietta Masina em "Noites de Cabíria", de Fellini), Frances enfrenta cada revés com otimismo incorrigível --o mesmo que, diante de uma pequena vitória, a leva a dançar pelas ruas.
Com "Frances Ha", o diretor Noah Baumbach confirma o talento demonstrado em "A Lula e a Baleia" (2005) e se livra de certos maneirismos do passado.
De quebra, oferece um retrato preciso sobre aquela fase da vida em que não sabemos exatamente que rumo tomar, o que fazer da vida --uma fase que, em alguns casos, teima em durar para sempre.
FRANCES HA
DIREÇÃO Noah Baumbach
PRODUÇÃO EUA, 2012
ONDE Reserva Cultural, Iguatemi Cinemark e circuito
CLASSIFICAÇÃO não informada
avaliação ótimo

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